Indiscutivelmente, a nossa sociedade mudou muito – e para melhor - nas últimas décadas, fruto de inúmeras reformas programadas e de acasos felizes. Aumento do nível de escolaridade por democratização do acesso, alteração do estatuto da mulher, melhoria global do nível de vida e terciarização acelerada são algumas das alavancas dessa transformação. Assim se reduziu o determinismo a que estavam sujeitas, há algumas décadas, as novas gerações na sua mobilidade social. É bom lembrar que durante séculos, filho de sapateiro, sapateiro seria. Nesse tempo, seria heresia pensar-lhe outro destino. Hoje já não é obrigatoriamente assim. Claro que ainda restam limitações, mas, por regra, ninguém vê bloqueada a sua mobilidade social só por causa da origem humilde da sua família. É bom que possamos transmitir às novas gerações que está ao seu alcance construírem o futuro que ambicionam e que será muito mais importante o seu mérito pessoal que a origem familiar ou social. Aliás, a nossa sociedade deve ser, cada vez mais, meritocrática.
Neste contexto, tanto o Professor Cavaco Silva, como o Eng. José Sócrates são um exemplo inspirador. Nenhum deles vem de “berço de ouro” e, apesar disso, atingiram os mais altos cargos da Nação. Têm nesse percurso um mérito pessoal inquestionável, mas beneficiaram também de uma sociedade que desbloqueou o “elevador social”. São um excelente incentivo a que outros não se sintam derrotados à partida, destinados a reproduzir o mesmo estatuto social dos progenitores.
Mas há um grupo para o qual este destino – reproduzir o estatuto social dos pais - ainda é uma realidade: os descendentes de imigrantes e de minorias étnicas, particularmente os provenientes de bairros pobres e guetizados em torno de Lisboa e Setúbal. Para eles, a simples referência no seu curriculum a uma morada da Cova da Moura, na Amadora, ou da Belavista, em Setúbal é sinónimo de nem sequer chegar à entrevista. A cor da sua pele, evidenciada na sua fotografia, tem o mesmo efeito. O facto de não terem nacionalidade portuguesa, apesar de aqui terem nascido, acrescenta mais um obstáculo.
Esta discriminação é, quase sempre, subtil e não acontece por faltarem leis que a proíbam. É um “tecto de vidro” que, mesmo não se vendo, os próprios sentem-no violentamente. A sua existência não os deixa ascender a níveis superiores de integração social e profissional, exclusivamente por causa da sua origem étnica ou social. Isso constitui uma fonte de revolta e uma enorme injustiça que urge reparar. A ascensão social deve ser resultado exclusivo do seu mérito, independentemente da cor da pele, ou do local onde mora. Hoje, que é o Dia Internacional que as Nações Unidas dedicam à eliminação da Discriminação Racial, deveríamos lembrar estes tectos de vidro e fazer alguma coisa para os destruir. No jogo da vida, há que garantir, à partida, igualdade de oportunidades para todos. Para que alguns não entrem já com a derrota inscrita no seu destino.
Correio da Manhã, 21 Março 2007
01 abril 2007
É possível
Havia um dogma na Televisão em Portugal: em regime de concorrência, não era possível fazer programação de qualidade e com audiência. Qualquer aposta na qualidade, seria sempre condenada a um falhanço de audiência e audiências de sucesso significariam, invariavelmente, uma má qualidade. Esta predestinação limitava quer a ousadia dos profissionais, quer a inteligência do público. A opção para quem queria muitos telespectadores era só uma: tele-lixo. Era comum, então, dizer-se que o público tinha a televisão que merecia.
Mas algo mudou, nestes últimos anos, sob o impulso de decisores políticos clarividentes, em diferentes Governos. Passo a passo, com determinação e génio, a RTP 1 tem vindo a mostrar que, afinal, é possível. Com uma programação inteligente e com bom-gosto, sem pretensiosismos bacocos, nem cedências gratuitas, o canal público tem mostrado o caminho. Soube evitar armadilha de confundir qualidade com snobismo ou seriedade com cinzentismo. Subtraíram a definição de “qualidade” do domínio dos intelectuais e tornaram-na popular. Com os Gatos, mas também com Dança Comigo; com a ficção portuguesa clássica, mas também com a Contra-Informação. E os resultados apareceram.
Neste roteiro está também uma informação credível, onde com o seu principal produto – o Telejornal - é líder de mercado. O risco de promover um grande debate semanal – Prós e Contras - e de colocar as Grandes Entrevistas em horário nobre foi recompensado pelo público. Este também continua a apreciar os momentos de Marcelo Rebelo de Sousa e de António Vitorino, dois dos mais brilhantes comunicadores do nosso espectro mediático. As críticas quanto a independência (ou falta dela) da informação não colhem, apesar de, aqui e além, poderem ser discutíveis os critérios editoriais. Mas, onde não o são?
É evidente que isto não significa que tenha atingido a perfeição. Longe disso. Aliás, é bom que os líderes desta revolução tranquila - seja a Administração da RTP, sejam Luís Marinho e Nuno Santos - não se deixem adormecer por estes sucessos. É importante que, no caminho trilhado, se vá mais longe. Sem quebras, nem hesitações. Porque se é possível fazer televisão com qualidade que os espectadores vêem, então há a obrigação de a fazer. Já não há desculpas. É possível.
Correio da Manhã, 14 Março 2007
Mas algo mudou, nestes últimos anos, sob o impulso de decisores políticos clarividentes, em diferentes Governos. Passo a passo, com determinação e génio, a RTP 1 tem vindo a mostrar que, afinal, é possível. Com uma programação inteligente e com bom-gosto, sem pretensiosismos bacocos, nem cedências gratuitas, o canal público tem mostrado o caminho. Soube evitar armadilha de confundir qualidade com snobismo ou seriedade com cinzentismo. Subtraíram a definição de “qualidade” do domínio dos intelectuais e tornaram-na popular. Com os Gatos, mas também com Dança Comigo; com a ficção portuguesa clássica, mas também com a Contra-Informação. E os resultados apareceram.
Neste roteiro está também uma informação credível, onde com o seu principal produto – o Telejornal - é líder de mercado. O risco de promover um grande debate semanal – Prós e Contras - e de colocar as Grandes Entrevistas em horário nobre foi recompensado pelo público. Este também continua a apreciar os momentos de Marcelo Rebelo de Sousa e de António Vitorino, dois dos mais brilhantes comunicadores do nosso espectro mediático. As críticas quanto a independência (ou falta dela) da informação não colhem, apesar de, aqui e além, poderem ser discutíveis os critérios editoriais. Mas, onde não o são?
É evidente que isto não significa que tenha atingido a perfeição. Longe disso. Aliás, é bom que os líderes desta revolução tranquila - seja a Administração da RTP, sejam Luís Marinho e Nuno Santos - não se deixem adormecer por estes sucessos. É importante que, no caminho trilhado, se vá mais longe. Sem quebras, nem hesitações. Porque se é possível fazer televisão com qualidade que os espectadores vêem, então há a obrigação de a fazer. Já não há desculpas. É possível.
Correio da Manhã, 14 Março 2007
Oportunidade ou Ameaça?
Conclui-se hoje, na Fundação Gulbenkian, o Colóquio Internacional dedicado à Imigração que escolheu como ângulo de análise, a dicotomia “ameaça ou oportunidade” para reflectir sobre este fenómeno incontornável do nosso tempo.
Não restam dúvidas que a imigração, se legalmente regulada e socialmente integrada, representa uma oportunidade extraordinária, quer para os países de origem, quer para os países de acolhimento, quer sobretudo para os próprios migrantes. Estes, entre os quais se contam 4,5 milhões de portugueses, encontram na sua emigração uma oportunidade para mudar de vida, cortando as amarras à pobreza, ao desemprego e aos horizontes limitados. Labutando e sofrendo, comem do pão que o diabo amassou, mas mudam o seu destino e o das suas famílias. Ajudam que ficou para trás e abrem caminho para os seus sigam em frente. Oferecem-lhes um futuro onde nunca chegariam não fora a oportunidade da emigração.
Mas os países de acolhimento beneficiam igualmente deste fluxo migrante. Através da resposta que os imigrantes dão a postos de trabalho livres, que os nacionais não querem ou não podem ocupar, estes países têm a oportunidade, através da imigração, de manter as suas economias competitivas. A estas sociedades, os imigrantes somam-lhes empreendedorismo e subtraem-lhes preguiça. Dão-lhes diversidade e retiram-lhes velhice. Não é por acaso, que entre os países mais poderosos estão nações de migrantes, como os Estados Unidos, o Canadá ou a Austrália, ou outros países com uma longa tradição de acolhimento de imigrantes, como a Alemanha.
Finalmente, também os países de origem vêem nestes movimentos migratórios uma oportunidade de reduzir a pressão de desemprego e de gerar remessas futuras. Estas representaram para Portugal, no ano passado, cerca de 2.420 milhões de Euros.
Mas todas as realidades têm duas faces. Indiscutivelmente, as migrações podem constituir uma ameaça, nomeadamente à coesão social, se as partes envolvidas ignorarem as suas responsabilidades em termos de integração. Tanto sociedades de acolhimento, quanto cidadãos imigrantes, são responsáveis pela integração, num processo dinâmico, interactivo e de adaptação mútua. Se aos nacionais é pedido que reconheçam e respeitem todos os direitos de cidadania aos imigrantes, destes é esperado que assumam todas as responsabilidades de um cidadão. Quem acolhe um imigrante, responsabiliza-se por integrá-lo. Quem escolhe um país de destino, obriga-se a respeitá-lo.
O processo de integração deve ser, por isso, motivo de convergência de esforços de todos – nacionais e imigrantes – para que os riscos da exclusão social, do medo e da desconfiança não transformem a extraordinária oportunidade que imigração representa, numa sombria ameaça que ninguém deseja. E não podemos guardar para amanhã, essa responsabilidade de hoje.
Correio da Manhã, 7 Março 2007
Não restam dúvidas que a imigração, se legalmente regulada e socialmente integrada, representa uma oportunidade extraordinária, quer para os países de origem, quer para os países de acolhimento, quer sobretudo para os próprios migrantes. Estes, entre os quais se contam 4,5 milhões de portugueses, encontram na sua emigração uma oportunidade para mudar de vida, cortando as amarras à pobreza, ao desemprego e aos horizontes limitados. Labutando e sofrendo, comem do pão que o diabo amassou, mas mudam o seu destino e o das suas famílias. Ajudam que ficou para trás e abrem caminho para os seus sigam em frente. Oferecem-lhes um futuro onde nunca chegariam não fora a oportunidade da emigração.
Mas os países de acolhimento beneficiam igualmente deste fluxo migrante. Através da resposta que os imigrantes dão a postos de trabalho livres, que os nacionais não querem ou não podem ocupar, estes países têm a oportunidade, através da imigração, de manter as suas economias competitivas. A estas sociedades, os imigrantes somam-lhes empreendedorismo e subtraem-lhes preguiça. Dão-lhes diversidade e retiram-lhes velhice. Não é por acaso, que entre os países mais poderosos estão nações de migrantes, como os Estados Unidos, o Canadá ou a Austrália, ou outros países com uma longa tradição de acolhimento de imigrantes, como a Alemanha.
Finalmente, também os países de origem vêem nestes movimentos migratórios uma oportunidade de reduzir a pressão de desemprego e de gerar remessas futuras. Estas representaram para Portugal, no ano passado, cerca de 2.420 milhões de Euros.
Mas todas as realidades têm duas faces. Indiscutivelmente, as migrações podem constituir uma ameaça, nomeadamente à coesão social, se as partes envolvidas ignorarem as suas responsabilidades em termos de integração. Tanto sociedades de acolhimento, quanto cidadãos imigrantes, são responsáveis pela integração, num processo dinâmico, interactivo e de adaptação mútua. Se aos nacionais é pedido que reconheçam e respeitem todos os direitos de cidadania aos imigrantes, destes é esperado que assumam todas as responsabilidades de um cidadão. Quem acolhe um imigrante, responsabiliza-se por integrá-lo. Quem escolhe um país de destino, obriga-se a respeitá-lo.
O processo de integração deve ser, por isso, motivo de convergência de esforços de todos – nacionais e imigrantes – para que os riscos da exclusão social, do medo e da desconfiança não transformem a extraordinária oportunidade que imigração representa, numa sombria ameaça que ninguém deseja. E não podemos guardar para amanhã, essa responsabilidade de hoje.
Correio da Manhã, 7 Março 2007
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