Comemora-se hoje os 400 do nascimento do Padre António Vieira, um dos grandes de Portugal. Do muito que se poderia dizer nesta ocasião, ilumina-se uma das ideias mais incompreendidas – e ridicularizadas – do pregador: o V Império.
Nascido em 1608, em Lisboa, Vieira conhece a sua Pátria num contexto de profunda crise. Com o desastre de Alcácer Quibir, onde em 1578 morrera o rei D. Sebastião, Portugal ficara sem descendentes e vulnerável à anexação por Espanha, que acaba por acontecer em 1580. Entre mortes e resgates, o País fica destroçado e, longe dos tempos de euforia dos Descobrimentos, entra no seu período mais negro.
Alguns anos depois, a resistência à anexação vai começando a ganhar forma mas eram grandes os obstáculos à concretização do desígnio da Restauração. A depressão pós-Alcácer Quibir e a força dos ocupantes tornam-na quase impossível.
Quando, em 1640, acontece a Restauração da Independência, é natural que muitos lhe atribuam contornos de milagre. Mas a profunda crise que Portugal vivia à época não se poderia resolver de um dia para outro. A independência reconquistada necessitava de ser consolidada todos os dias.
António Vieira, que ruma à metrópole em 1641, liderando uma delegação da província do Brasil que vem reconhecer o novo monarca, percepciona esse novo desafio e assume essa missão, em diferentes roupagens.
Este novo combate, fê-lo o jesuíta com todo o empenho, nomeadamente no púlpito e na pena, procurando construir um capital simbólico de esperança.
Aqui estará, provavelmente, a raiz das obras – ‘Esperanças de Portugal’, ‘Quinto Império do Mundo’, ‘História do Futuro’ e ‘Chave dos Profetas’ – que, duas décadas mais tarde, vão dar corpo ao mito do V Império.
Se considerado no essencial da sua mensagem e se focado na sua principal motivação mobilizadora de uma nação em perigo, o mito do V Império de António Vieira faz falta ao Portugal contemporâneo.
Como no seu tempo, Portugal precisa de se ultrapassar e reencontrar o seu destino no Mundo. Como na sua época, o desafio do multiculturalismo, da defesa da diversidade, do diálogo entre crentes e não crentes, bem como a promoção da dignidade humana são temas em agenda.
Mas, sobretudo, em tempos de crise, onde a nação se inquieta, urge afirmar que há futuro. Que Portugal pode ser capaz, como já o foi, de mais e melhor. É fundamental actualizar as ‘Esperanças de Portugal’. E se o V Império, tal como o sonhou Vieira, está datado, o essencial da sua função – construir a esperança, criar confiança e oferecer um desígnio nacional – continua actual e necessário.
Faltam Vieiras que o digam ao nosso tempo. Com engenho e arte.
20 fevereiro 2008
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