20 fevereiro 2008

Dilema no Kosovo

Que bom seria se nos momentos de decisão na vida tudo fosse preto ou branco. Que o mal se separasse do bem por uma linha visível e clara, onde não fosse difícil perceber as fronteiras nem muito menos que lado escolher. Mas não é assim. Na maioria das vezes ficamos perante dilemas de escolha difícil em que há, frequentemente, que escolher entre dois bens ou entre dois males. Acresce que a fronteira não surge como uma linha clara mas um espaço difuso. Ter clarividência suficiente para saber gerir os dilemas e escolher bem é, na política como na vida, um desafio sempre presente. Só que não é nada fácil.

Vem isto a propósito da recente declaração unilateral de independência da província sérvia do Kosovo. De um lado, o inquestionável direito dos povos à autodeterminação, expresso claramente na Carta das Nações Unidas e que no caso do Kosovo teve na declaração de domingo passado um apoio esmagador no seu parlamento. Parece não haver dúvidas de que a maioria dos kosovares quer ser independente. Mas, por outro lado, há a instabilidade que irá ser criada numa zona já por si efervescente, a oposição determinada da Sérvia, fortemente apoiada pela Rússia, e os ressentimentos que se gerarão. Esse passivo faz evidenciar um preço altíssimo a pagar por esta decisão – pelos kosovares mas também pelos seus vizinhos e, eventualmente, por nós todos – de tal forma que se questiona se faria sentido avançar já para a independência do Kosovo.

Temos, portanto, um dilema clássico entre dois bens: a autodeterminação de um povo e a estabilidade de uma região e mesmo de um continente. Como escolher o lado em que se quer estar? Provavelmente, a resposta certa está em não escolher – simplisticamente – um dos lados mas tentar fazer a ponte. Em vez de ser uma coisa ou outra, obter uma coisa e outra. Será possível?

O grande desafio na gestão de dilemas é conseguir ser fiel aos princípios mas estar aberto a uma negociação e a um gradualismo que nos faça evitar rupturas e choques. Estes podem destruir a bondade e a justiça de um princípio. Assim, esgotar todos os recursos negociais, usando e abusando da imaginação para a construção de soluções para vitórias comuns, é o caminho certo. Com paciência, muita paciência. Só assim se conseguirá ir mais longe.

No caso concreto do Kosovo, creio que não se esgotaram todas as possibilidades negociais para tentar uma solução concertada entre todas as partes. A aspiração frenética – compreensível – pela independência por parte dos kosovares parece ter feito ‘curto-circuitar’ um caminho negocial. Dirão alguns que jamais seria possível um acordo com os sérvios. Talvez, mas nunca o saberemos. O que temos, para já, é uma situação explosiva para gerir, com uma crescente tensão entre os apoiantes de um lado e outro. Russos e americanos, com os seus aliados europeus, vão esgrimir na arena internacional os seus argumentos pró e contra a independência do Kosovo. A paz vai ter que esperar.

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