Vivemos enclausurados no presente. É como se não tivéssemos passado, nem futuro. Sob a ditadura do instantâneo, debaixo da imposição da velocidade e limitados pelos ciclos curtos, vivemos já e agora. Depois logo se vê.
Quais são as consequências deste desígnio de vida? Onde nos leva esta “absolutização” do presente? Que sentido profundo para quem só conhece o imediato?
Desde logo, uma sociedade assim ignora os mais velhos. Coloca-os à margem e dispensa a sua memória. Acha-os um empecilho porque lhe lembra o passado desinteressante e deprecia-os porque são pouco produtivos na lógica do hoje. Atribui-lhes gavetas douradas, onde não devem incomodar. Permite-lhes que durem, mas não que existam verdadeiramente. Ficam pois impedidos de ser cidadãos plenos, e de nos trazer essa preciosa memória do passado, que nos ajudaria a entender o presente.
É bom não esquecer que quem ignora o passado, não aprende. Perde a densidade da experiência, a sabedoria que a tradição dos séculos nos traz. Ao cortar com o ciclo das gerações, que vão passando de mão em mão o testemunho da humanidade, dissipa-se o valor acrescentado da civilização. Esquece-se a natureza humana e ignora-se, por um lado, as suas fragilidades e, por outro, as suas potencialidades.
Precisamos de cultivar a memória do passado, sem saudosismos, nem alienações. E, para isso, necessitamos de recriar uma cidadania sénior, através da qual os mais velhos se sintam também construtores do presente. Com dignidade e valor acrescentado.
Mas há um outro lado da moeda deste império. Quem vive para o hoje, também ignora o amanhã. Não poupa, nem planta. Só desfruta. Desresponsabiliza-se da preservação dos recursos naturais e deixa o planeta aquecer. Demite-se de transmitir valores e tradições aos que nos sucedem, no pressuposto de não vale a pena. Não tem paciência, nem persistência. Não é capaz de diferir remunerações, nem de as emprestar ao futuro. Quer tudo para si e já.
Paradoxalmente, apesar de um discurso e de uma aparente prática de valorização das crianças e dos jovens, os escravos do hoje não são verdadeiramente solidários com as novas gerações. Se o fossem, agiriam diferentemente.
Temos, por isso, perante nós um enorme desafio de cultivar a solidariedade intergeracional. De reforçar uma cadeia, onde tudo se liga e na qual somos responsáveis não só pela gestão do presente, mas também por continuar o passado e viabilizar o futuro. A História não começou connosco, nem tão pouco irá acabar connosco. Por isso o império do hoje é mais uma armadilha a evitar.
23 março 2008
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