02 outubro 2007

Com Scolari

Sete dias passados sobre a noite escura de Alvalade, pode ser que a poeira já tenha assentado e possamos voltar ao tema, com a serenidade e lucidez que faltaram nos últimos dias.

Recuperando o essencial da história, Portugal fez uma dupla jornada de futebol, com a Polónia e a Sérvia, que correu mal. De situação vitoriosa até cinco minutos do fim, consentimos, em cada jogo, um golo azarado que nos custou, no somatório, quatro pontos. No jogo de Alvalade, o cair do pano trouxe adicionalmente um episódio triste em que um jogador sérvio provocou e tentou agredir Luís Filipe Scolari – valendo-lhe um cartão vermelho do árbitro – e o técnico respondeu irreflectidamente com uma tentativa de agressão. No dia seguinte, o técnico da selecção portuguesa, em conferência de imprensa, pediu desculpa aos portugueses e à UEFA pela sua atitude. Estes são, sinteticamente, os factos.

Espantosamente, o resultado foi a crucifixão pública de Scolari, como bode expiatório da frustração nacional. Nem o pedido de desculpas foi suficiente. Extraordinário.. Ninguém poupou palavra duras, condenações veementes ou pedidos de demissão. Como se tudo o que Scolari já fez ao serviço da selecção fosse nada e se um erro fosse tudo. Que injustiça flagrante!

Somos uma gente muito curiosa. Noutros tempos, numa atitude automática, gritaríamos – com razão - contra o árbitro (golo em fora-de-jogo), lamentaríamos o azar de sofrer um golo estranho a quatro minutos do fim e estaríamos, primeiro que tudo, a condenar o jogador sérvio que iniciou o episódio e a defender o nosso técnico. Agora, a irracionalidade voltou-se contra os da casa.

Imagine-se, por um instante, que tínhamos tido um pouco menos de azar e os jogos tinham acabado com o resultado dos 80 minutos e que ninguém tinha perdido a cabeça. Nesta altura, estávamos apurados para o Europeu e a laurear o treinador que, mais uma vez, nos levava a uma grande competição internacional. O nosso herói!

Só que os heróis também erram. São humanos. Mas poucos, no entanto, o admitem e pedem desculpa. E essa foi a grandeza de Luís Filipe. Quantos dos nossos heróis públicos que cometeram erros foram capazes de, em menos de 24 horas, pedir desculpa? Alguns, hipocritamente, sublinharam que, ainda assim, Scolari não tinha pedido desculpa ao jogador. Mas, era expectável fazê-lo, unilateralmente, quando a agressão foi iniciada pelo sérvio? Honestamente: é assim que cada um nós faz, na sua vida? Bom era...

A quatro jogos decisivos para o apuramento para o Euro, em que todos seremos poucos para não falhar o objectivo, deixámos vir à superfície a nossa veia suicida que Unamuno falava. Neste caso, além da insensata tendência suicida, mostramos outro péssimo defeito: a ingratidão.

Por isso, hoje e ainda a tempo, importa dizer: Scolari, estamos contigo, nos bons e, sobretudo, nos maus momentos. Os erros reconhecidos e emendados só servem para aprender. Vamos em frente! Esperam-nos quatro vitórias...

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