02 outubro 2007

O mercado e a Educação

Hoje é dia de heresia.

Apesar de ser bem conhecida a aversão do sistema educativo ao mercado e ao consumo, talvez houvesse algo a aprender com esse outro mundo. A atenção colocada no estudo do consumidor, dos seus gostos e dos seus comportamentos, precede quase sempre a acção de lançamento de um produto ou serviço para o mercado. Esta atenção centrada no cliente-consumidor foi simultaneamente causa e consequência de uma importante revolução na correlação de forças entre as partes. A diversidade de oferta, a concorrência, a necessidade de fidelizar clientes, o risco de ser penalizado quando se cometem erros, a urgência de permanentemente ouvir as sugestões, as críticas e as propostas dos consumidores fez com que os produtores de bens ou serviços deixassem de ser reis e senhores e se centrassem definitivamente nos clientes como caminho para o seu sucesso.

Esta comparação, que pode soar a heresia no contexto do sistema educativo, serve, neste caso, para sublinhar um dos mecanismos de funcionamento do mercado – o perceber muito bem o alvo da comunicação. O investimento realizado em estudos de mercado, observatórios e, mais recentemente, nos serviços de atendimento ao cliente, mostram quão importante é conhecer e compreender o cliente. E os resultados estão à vista.

Claro que a Educação não é igual à venda de sabonetes ou cereais. Todos sabemos disso. Nem se pode falar dos estudantes como de clientes, strictum sensu. No entanto, o que pode ser idêntico é a noção de que para comunicar com eficácia (e educar exige comunicar com a eficácia máxima) é indispensável compreender muito bem o nosso interlocutor. Isso obriga-nos a ir muito mais longe que o modelo educativo actual. Hoje, a Escola pede ao estudante que aprenda obedientemente o que se ensina, independentemente de se ensinar bem ou mal, ou mais grave ainda, se ensina o importante ou se se limita a acessórios. E como não cuida suficientemente de se avaliar a si própria, estranha o insucesso e simplifica a culpa, situando-a exclusivamente no aprendiz.

Essa opção radical de centragem no estudante não obriga, no entanto, a um atitude “seguidista” que torne o processo educativo refém de sondagens ou estudos de mercado. Há que saber situar esta atitude como ambiente indispensável para o sucesso do mecanismo interactivo do ensino/aprendizagem de saberes e competências essenciais.

Um pouco à semelhança de quando se encontra alguém de uma língua/cultura diferente, é importante fazer uma aprendizagem da língua (ou no mínimo, ter uma terceira língua comum) e dos costumes para poder comunicar plenamente. Isso pode ser essencial, para expressarmos adequadamente os nossos pensamentos/sentimentos de forma que, no outro contexto cultural, seja perceptível o que dizemos. Assim torna-se igualmente necessário, no processo educativo, que os seus principais actores (pais, professores e outros educadores) saibam aprender a “língua” e os costumes dos “estrangeiros” (não de outra terra, mas de outro tempo) que vivem nas nossas escolas.

Se o sistema educativo não tornar hábito estruturante o estudo e a compreensão dos seus estudantes, em cada segmento do tempo e do espaço, corre o risco de elevada taxa de ineficácia e concluir como frustrante a sua acção.

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