26 janeiro 2008

Princípios e interesses

É clássico colocar os princípios e os interesses como antagónicos e divergentes. Inimigos desde sempre, estes dois mundos confrontam-se (aparentemente) em todos os campos da nossa vida. Onde vingam os interesses não têm lugar os princípios e vice-versa. Diz-se, por exemplo, que os países não têm princípios, só têm interesses. Atrás desta dicotomia vem sempre a acusação de que quem defende princípios, nomeadamente na política, não tem a noção da realidade e é um ‘lírico’. Então, só a gestão dos interesses seria expressão da inteligência e a via eficaz da ‘real politik’. Ora, essa é uma visão comprovadamente errada.

Essa leitura da realidade radica num evidente pessimismo sobre a natureza humana e configura uma acção política utilitária sem horizonte nem sustentabilidade. Vejamos, por exemplo, o que tem acontecido ao nível do ambiente. Esquecidos os princípios de protecção da Terra que nos foi deixada em herança, em particular dos seus recursos naturais, deixámos à solta os interesses de um crescimento a qualquer custo e sem princípios. É certo que, a curto prazo, alguns beneficiaram com essa gestão de interesses. Mas torna-se já evidente o preço que todos vamos pagar por esse desenvolvimento sem princípios. O aquecimento climático, a crise energética, a desertificação ou a complexa gestão da água são evidências do que quer dizer a política dos interesses, interpretada sem princípios.

Se olharmos para uma outra dimensão, a do comércio internacional, de novo é evidente a que resultado nos conduz uma visão hiperpragmática de defesa de interesses próprios. O empobrecimento de muitos com quem comerciamos e a quem impomos um preço elevadíssimo nessa relação levar-nos-á a um beco sem saída. A repartição injusta da riqueza é uma bomba ao retardador. O desespero de uma cintura de pobreza à volta da Europa pressionará as nossas fronteiras até ao colapso. O êxodo à procura de sobreviver movimentará os pobres que o nosso egoísmo gerou. O facto de, enquanto países ricos, não termos princípios e só vivermos em função dos interesses egoístas – respeitando a regra suposta das relações internacionais – provoca uma catástrofe. Os interesses sem princípios são verdadeiros eucaliptos na nossa sociedade. Secam tudo e matam antecipadamente o futuro.

Os nossos interesses só são defendidos, sustentadamente, se forem respeitados princípios fundamentais. Sem princípios, estaremos sempre a perder. É só uma questão de tempo para percebermos os efeitos. Quem quiser ser verdadeiramente eficaz a defender os seus interesses comece por tornar sólidos os seus princípios. E entre esses, dê prioridade ao respeito pelo bem comum, à cultura de solidariedade e à promoção da justiça social. Precisamos de alcançar esta plena convergência de princípios e de interesses para que seja viável um Mundo melhor.

A erosão da confiança

Quando reflectimos sobre a pobreza e a riqueza das nações, o que condiciona o seu desenvolvimento ou o seu afundamento, vezes de mais somos canalizados para a análise da disponibilidade de recursos naturais, de capital ou de força de trabalho qualificado. Procuram-se, assim, explicações nos motivos mais óbvios que sendo parte da verdade não a esgotam e, muitas vezes, distorcem-na.

Como Alain Peyrefitte (‘A Sociedade da Confiança’, Edições Piaget) acreditamos que o que justifica o desenvolvimento sustentável de algumas nações é, acima e antes de tudo, o serem sociedades de confiança, onde se conjugam a liberdade, a autonomia e a responsabilidade, numa mistura virtuosa que faz milagres. Essa dinâmica assentaria fundamentalmente numa sociedade caracterizada pelo vínculo da confiança entre os seus cidadãos e entre cada um deles e as instituições. A estes acresceria, em lugar cimeiro, a confiança de cada um em si próprio, o que lhe daria uma capacidade de empreender e de assumir riscos, que seria essencial para o desenvolvimento.

Perante as dificuldades que enfrentamos, não podemos deixar de ler a crise segundo este filtro. Os índices de confiança na sociedade portuguesa têm vindo a sofrer uma erosão persistente, o que nos leva a não confiar em ninguém, nem sequer em nós próprios. Somos bombardeados por uma visão sempre pessimista da realidade e influenciados por um ambiente hostil de ataques cerrados por tudo e por nada. De igual forma, ficamos condicionados por uma evidência de maus exemplos, destacados na agenda mediática, e inevitavelmente somos empurrados para esta desconfiança militante que nos mina e nos corrói.

Quando assistimos à descredibilização – justificada ou não, pouco importa para este efeito – da política, da justiça, da autoridade policial, das empresas, da saúde ou da escola, a desconfiança dispara e perde-se a mola essencial capaz de nos projectar para os mais altos voos. Ficamos deprimidos e encolhidos. Medrosos e cinzentos. Falta-nos o combustível para caminhar, porque a confiança se esvaiu.

Nós, portugueses, precisamos de cuidar da confiança. Necessitamos de nos disciplinar para recusar a destruição suicida dos elos de confiança que nos unem (ou uniam). Devemos, ao mesmo tempo, cultivar pequenos e grandes gestos que nos mostrem que há – por regra – todas as razões para confiar e que os motivos para desconfiar (que também existem) não representam senão uma mínima expressão. Da mesma maneira, devemos fazer florescer tudo o que reforça a autoconfiança em cada um de nós. Nas nossas crianças e nos nossos adultos. Não há batalhas impossíveis para quem confia em si próprio e nos outros.

Esta responsabilidade é de todos nós. Cidadãos e cidadãs, antes de tudo. Mas é particularmente exigível aos políticos e aos jornalistas, aos juízes e aos professores, aos médicos e aos agentes de segurança, entre muitos outros, que a confiança se reforce. Neste processo é também vital que o Estado e as suas instituições consigam ganhar esse capital de confiança junto dos seus cidadãos. Sem confiança, não há futuro.

15 janeiro 2008

Diálogo intercultural

O ano que iniciou é dedicado, na Europa, ao diálogo intercultural. E bem. Num mundo que se globalizou radicalmente e onde (algumas) fronteiras se diluíram, afirmam-se o pluralismo e a diversidade como realidades incontornáveis.

Os que acreditaram que a globalização representaria uma uniformização cultural ou religiosa enganaram-se redondamente. Pelo contrário, por acção ou reacção, a globalização conduziu ao efeito inverso. Nunca foi tão evidente, à escala micro e macro, que a Humanidade é um imenso puzzle de peças diferentes e que qualquer sonho de uniformidade cultural ou religiosa não tem viabilidade.

Quer ao nível cultural quer ao nível religioso colocam-se importantes desafios de uma convivência pacífica entre diferentes tradições de povos vizinhos. Acresce que, graças à crescente mobilidade humana, no seio da própria Europa se torna evidente a necessidade de gerir essa diversidade cultural. Assim sendo, o único caminho é sermos capazes de gerir a diversidade.

Porém, não se julgue que é de agora esse desafio.

Ao longo de séculos, tendo pelo meio muitas etapas violentas de desencontro e de erros monstruosos, a Europa teve que gerir ao nível religioso a relação entre católicos e protestantes, ou entre cristãos e judeus. Também ao nível cultural, a presença de fortíssimas matrizes culturais – escandinavas, anglo-saxónicas, germânicas, francesas – exigiu esse esforço de diálogo e de encontro. Trata-se, agora, de renovar essa experiência.

Num primeiro nível, o diálogo intercultural tem como foco essencial, numa sociedade plural, o reforço do sentido de pertença e a construção participada de uma comunidade de destino, partindo do respeito mútuo pela diversidade, considerada um valor em si mesmo.

Mais do que uma co-existência pacífica de diferentes comunidades e indivíduos, o modelo intercultural afirma-se no cruzamento cultural, sem aniquilamentos, nem imposições. É uma dinâmica interactiva e relacional. Muito mais do que a simples aceitação do ‘Outro’ propõe-se o acolhimento do ‘Outro’ e transformação de ambos com esse encontro, decorrendo daí um novo ‘Nós’.

Sempre plural, mas também sempre coeso.

Note-se, para que não restem dúvidas, que o diálogo intercultural se desenvolve sempre e só no quadro dos Direitos Humanos, da Democracia, do Estado de Direito com o primado da Lei. Do lado das obrigações, mas também dos direitos. Mas não admite que existam uns ‘mais iguais do que outros’, nem assume a Lei como algo de cristalizado e imutável.

A opção intercultural é, de todas as políticas de gestão da diversidade cultural, a mais exigente: necessita, para o seu desenvolvimento, de convicção, investimento, negociação e transformação mútua. Por isso, o Ano Europeu do Diálogo Intercultural é uma excelente oportunidade para investir neste caminho.

04 janeiro 2008

Três desejos

Os ciclos do tempo têm esta impagável vantagem de permitirem uma sensação de renascimento. De começar de novo. De aspirar a que o amanhã possa ser diferente de ontem. De se ter deixado para trás tudo o que não presta. De pôr os contadores a zero.

Ainda que, em grande parte, não passe de ilusão de óptica, há que aproveitar a boleia. Cada um de nós saberá que metas colocar para si neste recomeço.

Para uns, sem ser demasiado ambicioso, usando uma estratégia de ‘pouco, pequeno e possível’, talvez se consiga alcançar algo. Para outros, só os grandes desafios os mobilizam suficientemente e nada menos do que o (quase) impossível é interessante. Para todos, o importante mesmo é concretizar essas metas, quaisquer que sejam, com toda a energia e convicção dos recomeços.

Colectivamente também precisamos desta nova oportunidade. Que desejos temos para o próximo ano? Que ambicionamos para o nosso destino comum, nos próximos meses? Pelo meu lado, atrevo-me a enunciar três desejos, tão simples quanto próximos da utopia. O primeiro desejo é que saibamos dizer mais vezes “o que é que posso fazer pelo meu país?” em vez de “alguém tem de fazer alguma coisa por este país!” Se formos consequentes com esta atitude, seremos mais participativos, mais exigentes e mais generosos. Deixaremos para trás uma atitude sebastiânica infantil que nos desresponsabiliza e perceberemos que a possibilidade de um futuro melhor está nas nossas mãos. Assim, cumprindo a nossa parte, poderemos fazer muito por um Portugal melhor.

O segundo desejo liga-se com o primeiro. Gostava que fossemos capazes de reforçar, em primeiro lugar, o que nos une, em vez de acentuar sempre o que nos divide. Somos um pequeno povo que já foi capaz de grandes feitos e... de grandes disparates. Mas se há uma no-ta comum, que já vem desde o tempo dos lusitanos, é que tendencialmente “não nos governamos nem nos deixamos governar”. Em grande medida isso resulta da permanente fractura interna em que vamos vivendo. Precisamos, ao invés, de reforçar a coesão nacional, porque há muito que se sabe que “a união faz a força”. O último desejo, e porventura o mais importante, é que viremos as costas à lamúria e ao pessimismo e saibamos reforçar a esperança e a confiança. Precisamos de contrariar o vaticínio de Unamuno e provar que não somos um povo de suicidas. Chega de discursos catastróficos e de vozes de mau agoiro. Basta de profecias da desgraça e de becos sem saída. Quanto maiores as dificuldades, mais urgente é a esperança.

Para os próximos meses precisamos de acreditar que, se fizermos por isso, o futuro pode ser melhor. Mas não desprezemos esta dimensão do ‘acreditar’. Muito à nossa maneira, só faremos alguma coisa por um futuro melhor se acreditarmos, se nos transcendermos, se ousarmos. Se não, mesmo que sejamos tecnicamente capazes e que até tenhamos os meios, não o faremos.

Boas intenções, dirão alguns. Sê-lo-ão, com certeza. Mas se não nos inspirarmos nelas, creio não iremos a lado nenhum. Bom ano!

01 janeiro 2008

O dia seguinte

Mais um Natal se comemorou. Com a tradição mais ou menos respeitada, em torno da agitação das festas, das prendas e das comidas, à medida de cada um, lá se passou. Tornámo-nos, provavelmente, seres exaustos. Aproveitámos, talvez, para fazer algum Bem que a corrida dos dias, ao longo do ano, não deixa tempo, nem cria ambiente. Deixámos, quem sabe, um gesto de solidariedade, aqui ou além, para os que não tiveram consoada, ou não sentiram o calor da família reunida. Mas agora, passado o dia de Natal, voltaremos ao normal, à nossa “vidinha”, sem tempo para essas coisas. Ainda não percebemos que o verdadeiro sentido do Natal se percebe – ou não – no dia seguinte.

Quando terminou toda a agitação externa, quando as luzes já não encandeiam a alma e quando os doces já não iludem o verdadeiro sabor da vida, aí estamos prontos para entender o Natal. Que encontraremos então, se soubermos ver o invisível? A experiência cristã, ao alcance pleno dos crentes, mas também entreaberta aos não-crentes, deixa-nos um Deus-menino que se tornou Homem, partilhando as contingências da nossa vida. Desde o primeiro momento de um nascimento em pobreza, até um último suspiro, pendurado injustamente numa cruz, Ele foi um de nós. Esta mensagem de um Deus que desce da sua morada grandiosa e, por Amor, se disponibiliza a viver connosco todas as vulnerabilidades humanas é extraordinária. Numa cultura judaica, onde o divino era sempre magnificente e distante, esta mensagem de um vulnerável Deus-menino era inesperada e mesmo escandalosa. Ainda hoje estamos na mesma. Custa-nos muito imaginar o rosto de Deus na simplicidade e na discrição. Mas foi isso que resultou daquela noite maravilhosa, em Belém da Judeia, há dois mil anos.

Uma outra dimensão que se descobre neste mistério cristão do Natal é um Deus-menino que se transforma em nosso Irmão. Que nos eleva à categoria de participantes na divindade. Sem distância, como se tocássemos a eternidade. Mas se percebermos bem a dimensão dessa herança do dia seguinte, em que nos descobrimos irmãos não só Dele, mas de todos os homens, o Natal ganhará uma consequência extraordinária. Como seria diferente o mundo se víssemos sempre no outro homem, um irmão! Como tudo poderia ser melhor...

Finalmente, podemos descobrir no dia seguinte, a forma como nos quis mostrar também que a força de Deus começa por repousar sobre os mais pobres e mais fracos, entre os que não têm lugar na hospedaria para nascer, entre os que, para sobreviver, têm que fugir, ainda que acabados de nascer. O dia seguinte desafia-nos, por isso, aos que temos muito. Desafia-nos a desacomodarmo-nos e, como os Magos, irmos à sua procura, nos estábulos dos nossos dias. À margem das luzes, do conforto e da fama.

Alguns, teremos a sorte de O descobrir como Deus; mas todos o poderemos ver como inspiração. Esta é a magia do dia seguinte.

(26/12/2007)

Discernimento

Se olhássemos o mundo pela perspectiva do mercado diríamos, que se vive, no lado da oferta, uma Era de abundância e de diversidade, provavelmente sem paralelo na História da Humanidade. Do lado da procura, apesar das limitações e das excepções, existe um assinalável incremento na capacidade de consumo da oferta disponível – e de novas exigências – que retroage positivamente, estimulando mais oferta.

A ascensão do consumo, estimulado por esta economia de mercado ufana e triunfante, que transporta uma oferta sempre crescente de bens e serviços é assim evidente e, potencialmente, contagia todos os domínios do consumo. Do entretenimento à indústria automóvel, dos media aos hipermercados, das indústrias culturais à internet, multiplicam-se as referências e as ofertas. As mais recentes tendências de segmentação e de personalização da oferta aumentam ainda mais este registo, indo ao extremo de ter tantos sub-produtos quantos os sub-grupos de consumidores.

Também na vida das empresas, esta dinâmica tem várias expressões. Decorrente da globalização, abriram-se mercados enormes, que ultrapassam fronteiras geográficas ou hábitos culturais. Por outro lado, a já referida segmentação fina do consumo, criou uma diversidade de oportunidades – e de ameaças – para a afirmação de produtos e serviços. Ambos os movimentos ocorrem num ambiente de fortíssima concorrência que exige, desde logo, uma enorme capacidade de discernimento empresarial.

Mas esta abundância e diversidade não se vive só no mercado. Está em todo o lado e mudou a nossa vida.

Não se trata, contudo, de uma abundância monocromática, nem de uma diversidade coerente. A complexidade e a contradição somam-se como características estruturantes do tempo presente e futuro. Vive(re)mos num labirinto, rodeados de resmas de informação, num arco-íris de opções. É, e será, cada vez mais um mundo angustiante para indecisos – tantos caminhos! - e perigoso para simplistas – destruídos pelas armadilhas da complexidade.

Por isso, emerge a necessidade imperiosa de desenvolver e consolidar, a nível individual e colectivo, a capacidade de discernimento – saber, em cada momento, fazer as perguntas certas, conhecer e seleccionar a informação disponível relevante e, sobre ela, fazer um juízo. Em consequência, tomar opções, operacionalizá-las e, finalmente, avaliá-las, integrando a aprendizagem decorrente da experiência na sua capacidade futura de discernimento.

Em certa medida, o passaporte para o futuro exige como visto, a capacidade de escolher, sustentada a montante no acesso e na leitura dos dados e a jusante na capacidade de dar resposta e avaliar decisões.

Audácia da Esperança

Por estas semanas, nos Estados Unidos da América (EUA), aceleram as primárias que permitirão aos dois maiores partidos – republicano e democrata – escolherem os seus candidatos para as presidenciais do próximo ano. Se entre os republicanos nada de interessante se passa, já no campo dos democratas assiste-se a uma luta inédita. Os dois candidatos melhor posicionados são Hillary Clinton e Barack Obama. Assim, os democratas apresentarão, pela primeira vez na história do seu país, uma mulher ou negro como alternativas para o mais alto cargo político dos EUA e, porventura, um dos mais importantes protagonistas mundiais. Caso um deles venha a ser o próximo presidente dos EUA o impacto simbólico não será pequeno e seria uma excelente notícia para o mundo.

Entre os dois, salienta-se contudo o senador Obama. Com 46 anos, este americano já revolucionou com a sua candidatura o panorama político americano. Licenciado em direito em Harvard, filho de uma americana e de um queniano, trabalhador social em bairros deprimidos de Chicago, surgiu como voz de uma política de esperança que tem levantado muitos apoios. Apesar das sondagens ainda lhe darem um segundo lugar atrás de Hillary, não se pode ignorar o eco que a sua mensagem tem tido nos americanos de todas as origens. Ao ler recentemente o seu livro “A audácia da esperança” pude perceber um pouco melhor o sucesso de Obama. E entusiasmar-me com ele.

Sem ser um candidato anti-sistema, o senador percebeu “a política pode ser diferente e que os eleitores querem qualquer coisa de diferente. Percebi que estão fartos de distorções, de ofensas pessoais, de sound-bites para resolver problemas complicados..” E esta a ensaiar a resposta a este desafio.

Creio que, do muito que o livro evidencia, a força da proposta que Barack Obama interpreta, resulta sobretudo da fusão entre uma forte preocupação de justiça e coesão social, com a defesa de valores de sempre. Assume, por isso, sem rodeios que “para promover a sociedade que desejamos precisamos tanto de transformação cultural quanto de acção governamental; de uma mudança de valores e de políticas” e que “é a linguagem dos valores que as pessoas usam para ordenar o seu mundo, é o que lhe põe servir de inspiração para fazer agir e fazê-las sair do seu isolamento”.

Para o nosso contexto europeu, avesso a centrar-se nos valores profundos enquanto eixo da acção política, ou sempre pronto a catalogar qualquer defesa de valores como atitude típica da “direita”, Obama representa uma voz inesperada, tanto mais porque é de “esquerda”. Acresce que defende valores a partir de uma perspectiva positiva, marcada pela audácia da esperança, traço comum que visualizou na esmagadora maioria dos americanos com que se foi encontrando. E é essa política da esperança que o levará longe, porque, como disse Luther King, “tudo o que é construído no mundo, é construído pela Esperança”.

Do outro lado do Atlântico, sopram ventos novos que nos devem inspirar.