Quando reflectimos sobre a pobreza e a riqueza das nações, o que condiciona o seu desenvolvimento ou o seu afundamento, vezes de mais somos canalizados para a análise da disponibilidade de recursos naturais, de capital ou de força de trabalho qualificado. Procuram-se, assim, explicações nos motivos mais óbvios que sendo parte da verdade não a esgotam e, muitas vezes, distorcem-na.
Como Alain Peyrefitte (‘A Sociedade da Confiança’, Edições Piaget) acreditamos que o que justifica o desenvolvimento sustentável de algumas nações é, acima e antes de tudo, o serem sociedades de confiança, onde se conjugam a liberdade, a autonomia e a responsabilidade, numa mistura virtuosa que faz milagres. Essa dinâmica assentaria fundamentalmente numa sociedade caracterizada pelo vínculo da confiança entre os seus cidadãos e entre cada um deles e as instituições. A estes acresceria, em lugar cimeiro, a confiança de cada um em si próprio, o que lhe daria uma capacidade de empreender e de assumir riscos, que seria essencial para o desenvolvimento.
Perante as dificuldades que enfrentamos, não podemos deixar de ler a crise segundo este filtro. Os índices de confiança na sociedade portuguesa têm vindo a sofrer uma erosão persistente, o que nos leva a não confiar em ninguém, nem sequer em nós próprios. Somos bombardeados por uma visão sempre pessimista da realidade e influenciados por um ambiente hostil de ataques cerrados por tudo e por nada. De igual forma, ficamos condicionados por uma evidência de maus exemplos, destacados na agenda mediática, e inevitavelmente somos empurrados para esta desconfiança militante que nos mina e nos corrói.
Quando assistimos à descredibilização – justificada ou não, pouco importa para este efeito – da política, da justiça, da autoridade policial, das empresas, da saúde ou da escola, a desconfiança dispara e perde-se a mola essencial capaz de nos projectar para os mais altos voos. Ficamos deprimidos e encolhidos. Medrosos e cinzentos. Falta-nos o combustível para caminhar, porque a confiança se esvaiu.
Nós, portugueses, precisamos de cuidar da confiança. Necessitamos de nos disciplinar para recusar a destruição suicida dos elos de confiança que nos unem (ou uniam). Devemos, ao mesmo tempo, cultivar pequenos e grandes gestos que nos mostrem que há – por regra – todas as razões para confiar e que os motivos para desconfiar (que também existem) não representam senão uma mínima expressão. Da mesma maneira, devemos fazer florescer tudo o que reforça a autoconfiança em cada um de nós. Nas nossas crianças e nos nossos adultos. Não há batalhas impossíveis para quem confia em si próprio e nos outros.
Esta responsabilidade é de todos nós. Cidadãos e cidadãs, antes de tudo. Mas é particularmente exigível aos políticos e aos jornalistas, aos juízes e aos professores, aos médicos e aos agentes de segurança, entre muitos outros, que a confiança se reforce. Neste processo é também vital que o Estado e as suas instituições consigam ganhar esse capital de confiança junto dos seus cidadãos. Sem confiança, não há futuro.
26 janeiro 2008
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