“Se servistes a Pátria e ela vos foi ingrata, vós fizestes o que devíeis, e ela o que costuma.”
P. António Vieira
Um dos nossos maiores defeitos enquanto Povo é a ingratidão perante os que servem Portugal. Somos vezes de mais, nesse domínio, grosseiros e insensíveis. Não cuidamos de reconhecer e agradecer àqueles que serviram o Bem comum, desdenhando da sua competência, da sua intenção e da sua virtude. Escondemo-nos atrás do “não fizeram mais que a sua obrigação!” ou pior ainda “se o fizeram é porque tinham algum interesse”. Como sublinhava Flaubert “aos incapazes de gratidão nunca lhes faltam razões para não a ter”. E nós por costume, somos incapazes de dizer obrigado, tornando-nos assim seres vulgares e gente sem nobreza.
Note-se que ser grato, nada tem a ver com ser servil ou bajulador. Disso, infelizmente, temos de sobra. A gratidão exerce-se sobretudo quando já não é possível ao agradecido retribuir ou recompensar tal gesto. Quando não há risco de ter alguma coisa a receber. Quando o visado está na “mó de baixo” ou quando é vítima de ataques vários, entre os quais o do esquecimento.
Trago alguns exemplos para não ficar por generalidades. Não temos vergonha enquanto Povo, que Gaspar Castelo Branco, o mais alto dirigente público assassinado por terroristas das FP 25, em 1986, nunca tenha sido homenageado e condecorado pelo Estado português? Não temos coragem para corrigir a forma vergonhosa como nos portámos, enquanto País, no momento da sua morte? Ou não temos nenhum peso na consciência, por termos deixado que personalidades políticas e servidores do Estado que serviram Portugal com tudo o que tinham e sabiam, como Leonor Beleza ou Roberto Carneiro tivessem sido triturados por notícias e processos judiciais que se vieram a provar como injustificados? Não nos escandalizamos que, inúmeras vezes, quando um servidor do Estado, seja membro de força de segurança ou outro, morre em serviço, atribuamos aos seus dependentes uma mísera pensão, normalmente depois de meses eternos de espera? Que gente somos nós?
Mas se por um lado, esta constatação nos deve fazer corar de vergonha – e fazer-nos corrigir este defeito colectivo – por outro, em nada deve beliscar o nosso sentido de dever no serviço à Pátria. Porque mesmo que esta seja ingrata, servi-la, bem como à humanidade no seu todo, é um dever. Como diz Vieira, é “fazer o que devemos”. Da melhor forma que sabemos e podemos, sem esperar recompensa. Infelizmente, nos nossos dias, desvalorizamos esta noção de serviço ao bem comum e à causa pública. Privatizamos os nossos interesses e descuramos a construção colectiva da comunidade onde nos inserimos. Não damos exemplo, nem transmitimos aos nossos filhos a paixão pelo serviço a Portugal. Cultivamos mesmo um cepticismo cínico que goza com quem “estupidamente” segue esse caminho. Mas não tenhamos dúvidas: assim, cavamos a nossa vala comum.
Correio da Manhã, 11 de Abril
11 abril 2007
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