Cinquenta anos de utopia construída é obra. Contra ventos e marés, cumpriu-se por estes dias meio século de existência do que hoje chamamos União Europeia. Apesar de não termos estado entre os seis fundadores, devemos festejar este momento histórico desta Europa a que pertencemos. Mas, em tempo de festa, é uma boa oportunidade para regressar às origens e actualizar o projecto, revivificando-o.
Porque é que nasceu a Europa?
É bom lembrar que a ideia de uma comunidade europeia surge no contexto de um continente em escombros, após a IIª Guerra mundial, ainda mais brutal que a primeira. Apesar de só indirectamente termos sentido os efeitos dessa catástrofe é importante não a esquecer, bem como ter presente que o risco da sua repetição nunca está definitivamente afastado. O melhor antídoto para evitar novos tempos sombrios é persistir na inspiração dos que, a partir de uma Europa dilacerada e dividida entre inimigos, ousaram pensar diferente.
Com efeito, os homens que lutaram por este sonho que se tornou realidade – Schuman, Adenauer, Monnet, entre outros – sabiam que a construção de um futuro de paz, num continente tradicionalmente devorado por guerras cíclicas, só seria possível num quadro de uma maior justiça e redistribuição solidária da riqueza. Mas também de interdependência e com um mercado comum, de livre circulação de bens, capitais e trabalhadores. E o mais extraordinário é que foram capazes de o fazer entre potências inimigas, saídas de uma guerra. Ao colocarem o seu futuro nas mãos uns dos outros, criaram condições para que ninguém fosse dispensável e que se tornasse inviável uma nova Guerra. Dizia Schuman: “A Europa unida prefigura a solidariedade universal do futuro..Estendemos a mão aos nossos inimigos, não apenas para nos reconciliarmos, mas para construirmos juntos a Europa do amanhã” Como resultado, tivemos cinquenta anos de paz e de um desenvolvimento extraordinário. Essa é a perspectiva fundadora do projecto europeu, com a qual se deve estar em sintonia absoluta. Por isso, para o nosso tempo é fundamental recuperar esta inspiração original da fundação da Comunidade Europeia, percebendo que é no repartir que está o ganho. Só teremos sucesso juntos.
Ora, entre nós, temos da União Europeia, tantas vezes, uma visão utilitarista e egoísta, de quem está sempre à espera de receber alguma coisa, nomeadamente, fundos comunitários. Discutimos muito pouco o que temos a dar. Evitamos pensar sobre o que podemos contribuir para que concretize o princípio de solidariedade com os mais pobres, que aguardam à porta da União a sua oportunidade de entrar. Mas essa é mesmo a questão fundamental: o que estamos dispostos a dar? Temo que a resposta possa ser “nada” ou “muito pouco”. Mas se assim o for, saibamos que estamos fora do espírito europeu.
Na comemoração do cinquentenário, numa ocasião histórica em que um Português, pela primeira vez, preside aos destinos da Comissão Europeia, é uma boa altura para reforçarmos a nossa pertença a este projecto, estando disponíveis para dar o melhor de nós, para continuar a construir um continente de paz.
Correio da Manhã, 28 de Março 2007
01 abril 2007
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